A odontologia no âmbito do câncer bucal

A odontologia no âmbito do câncer bucal

A importância do cirurgião dentista na prevenção e diagnóstico precoce do câncer bucal

Escrito por: Guilherme Trafani Sanches, Msc, Dentista Estomatologista (CRO-SP: 102250)

O carcinoma epidermoide oral é a neoplasia maligna mais comum da cavidade oral. Os pacientes acometidos por essa doença apresentam baixa taxa de sobrevida. Essa taxa é, em média, de 50% em 5 anos. Detectar o carcinoma epidermoide oral precocemente deve constituir um objetivo, uma vez que o diagnóstico precoce propicia um tratamento mais efetivo e com menos efeitos colaterais. Isso confere ao paciente um melhor prognóstico.1-3

Para se predizer um determinado prognóstico e escolher a melhor opção terapêutica, não somente o grau histológico, mas também o estágio do tumor, no momento pré-operatório, é muito importante e precisa ser considerado. Esse estágio é melhor definido através de um sistema de estadiamento denominado TNM, que avalia o tamanho do tumor primário (T), envolvimento linfonodal (N) e metástases à distância (M). As taxas de sobrevida são maiores nos casos em que a doença está localizada, em relação aos casos em que a doença se estende além do órgão de origem. O diagnóstico precoce das neoplasias malignas permite que essas sejam tratadas quando apresentam estágios pouco avançados, o que é favorável para a evolução clínica do paciente.3-5

O carcinoma epidermoide oral frequentemente se apresenta como uma úlcera que não cicatriza, indolor e de rápido crescimento. O aspecto clínico varia conforme o tempo de evolução e a origem da lesão, a qual pode ser proveniente de condições que apresentampotencial de transformação maligna. Identificar o carcinoma epidermoide oral e as condições orais potencialmente malignas é fundamental para que o cirurgião dentista possa melhorar a taxa de sobrevida dos pacientes.6,7

O cirurgião dentista deve, ao verificar a presença de lesão com hipótese diagnóstica de carcinoma epidermoide oral, realizar uma biópsia incisional e enviar o material coletado para o exame histológico. Esse exame representa o “padrão ouro” para o diagnóstico da doença. Considera-se que o carcinoma epidermoide oral possa ser precedido por lesões que contêm displasia e, como a evolução maligna da displasia pode ocorrer em muitos anos, é possível prevenir o desenvolvimento da doença.8,9

Existem diferentes condições da cavidade oral com potencial para transformação maligna, como leucoplasia, eritroplasia, eritroleucoplasia e leucoplasia verrucosa proliferativa. É essencial que o cirurgião dentista identifique precocemente essas condições. Uma atenção especial deve ser dada à eritroleucoplasia e à eritroplasia, uma vez que essas lesões tendem a apresentar displasias epiteliais mais intensas e, assim, maior potencial de transformação maligna.7,10,11

O papel do cirurgião dentista no diagnóstico precoce do carcinoma epidermoide oral deve contemplar o princípio da integralidade, uma vez que é necessário compreender o contexto social no qual o paciente está inserido e orientá-lo sobre a importância de hábitos saudáveis para prevenir o advento de doenças bucais. Pode-se dizer que a prevenção do câncer é mais importante que o diagnóstico precoce. O abandono de hábitos nocivos, como o tabagismo e o etilismo, fatores de risco para o surgimento do carcinoma epidermoide oral e outras doenças, constitui uma ação necessária para a manutenção da saúde bucal. O cirurgião dentista tem a função de esclarecer os pacientes sobre os fatores de risco do câncer e instruí-los sobre como prevenir o surgimento de doenças bucais.12

Após a realização do processo de diagnóstico, é necessário iniciar o plano de tratamento mais adequado às condições individuais do paciente. Nesse contexto, é fundamental a presença de profissionais de diferentes áreas, o que implica um atendimento multidisciplinar. A multidisciplinariedade na oncologia é definida como a cooperação entre diferentes especialidades envolvidas no cuidado do paciente oncológico e teve seu início em meados de 1980, quando a quimioterapia foi integrada ao tratamento radioterápico e cirúrgico e, assim, houve melhora da sobrevida dos pacientes. Como o câncer de cabeça e pescoço influi negativamente em funções como fala e deglutição e, dessa forma, piora a qualidade de vida dos pacientes, além da oncologia, outras áreas, como as de odontologia, enfermagem, nutrição e psicologia, devem atuar de forma integrada. A integralidade e a multidisciplinariedade são princípios que devem nortear a assistência do paciente oncológico.12

Referências bibliográficas

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