Caso clínico: Paciente de 31 anos, divorciada com diagnóstico de condiloma genital e histórico de lesão de alto grau no colo do útero

Caso Clínico

Paciente de 31 anos de idade, divorciada, com diagnóstico de condiloma genital e histórico de LESÃO DE ALTO GRAU NO COLO DO ÚTERO

Dr. Valentino Magno

Dr. Valentino Magno
CRM-RS 25.799, RQE 19.884
(Ginecologia e Obstetrícia)
Professor Adjunto da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Membro da Comissão Nacional de Vacinas da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo). Membro da Diretoria da Associação Brasileira de Patologia do Trato Genital Inferior e Colposcopia (ABPTGIC).

CASO CLÍNICO

PERDA DE OPORTUNIDADE DE VACINAÇÃO CONTRA O HPV

O caso em questão demonstra uma paciente que tinha indicação de receber a vacina contra HPV para a prevenção de recorrência da NIC de alto grau tratada e para se proteger da exposição pelos outros subtipos virais que ela poderia ter contato.

HISTÓRICO DA PACIENTE

DADOS PESSOAIS

  • 31 anos de idade
  • Divorciada
  • Tabagista 5 cigarros/dia desde os 20 anos
  • Nega etilismo ou uso de outras drogas
  • Nega uso de medicações

HISTÓRIA PREGRESSA

  • Menarca aos 13 anos e sexarca aos 17 anos
    de idade
  • Uso de contracepção via oral combinada
  • Parto normal: 29 anos
  • Após a gestação: sem método contraceptivo
  • Ciclos regulares nesse período
  • Sem utilização de medicações
  • Nega alergias, cirurgias ou tratamentos crônicos para problemas de saúde

MOTIVO DA 1ª CONSULTA GINECOLÓGICA

  • Lesões vulvares (cerca de 60 dias)

MOTIVO DA 2ª CONSULTA GINECOLÓGICA

  • Lesões vulvares: início de atividades sexuais com novo parceiro e 6 meses após o procedimento do colo uterino

13 MESES APÓS O PARTO

TIMELINE 1ª CONSULTA, DIAGNÓSTICO, INTERVENÇÃO E ORIENTAÇÕES

TIMELINE 1ª CONSULTA, DIAGNÓSTICO, INTERVENÇÃO E ORIENTAÇÕES

NOVA CONSULTA: 6 MESES APÓS PROCEDIMENTO DE COLO UTERINO

TIMELINE NOVA CONSULTA, DIAGNÓSTICO, INTERVENÇÃO E ORIENTAÇÕES

TIMELINE NOVA CONSULTA, DIAGNÓSTICO, INTERVENÇÃO E ORIENTAÇÕES

Figura 1. Lesões características de condiloma genital

Lesões características de condiloma genital

Fonte: Acervo do autor.

Na história ginecológica pregressa, relatava menarca aos 13 anos e sexarca aos 17 anos de idade. Utilizou contracepção via oral combinada dos 17 anos até os 28 anos de idade, quando suspendeu para gestar. Teve parto normal aos 29 anos de idade, sem intercorrências. Após a gestação, não usou mais nenhum método contraceptivo, pois o parceiro tinha feito vasectomia. Referindo ciclos regulares nesse período e sem utilização de medicações. Negava alergias, cirurgias ou tratamentos crônicos para problemas de saúde.

Após 13 meses do parto, fez exame ginecológico de rotina no qual foi constatada lesão de alto grau do colo do útero no citopatológico. Foi então encaminhada para colposcopia e biópsia, que confirmaram o diagnóstico de neoplasia intraepitelial cervical (NIC) de alto grau. Após o resultado da biópsia, foi submetida à cirurgia de alta frequência. O procedimento ocorreu sem complicações e o anatomopatológico foi de NIC 3 com limites ecto e endocervicais livres. Recebeu a orientação de realizar revisão semestral por 1 ano para confirmar a cura da lesão e questionou a necessidade de vacinação contra o papiloma vírus humano (HPV), pois havia se divorciado em 2023. A orientação recebida foi a de que não se beneficiaria mais da vacinação, pois já estava adulta e já tinha tido contato com o vírus. Portanto, segundo as informações recebidas, além de não se beneficiar da vacinação, deveria usar sempre o preservativo, principalmente porque não estava usando outro método contraceptivo.

Foi encaminhada ao nosso setor após 6 meses do procedimento do colo uterino devido às lesões vulvares após início de atividades sexuais com novo parceiro. Durante a consulta no nosso setor, referia tabagismo de 5 cigarros por dia desde os 20 anos de idade e negava etilismo ou uso de outras drogas. Negava uso de medicações e trazia um citopatológico recente sem alterações.

Ao exame físico da vulva, a paciente apresentava as lesões mostradas na figura 1.

Após exame ginecológico completo, algumas lesões atípicas foram biopsiadas e todas receberam o diagnóstico de condiloma genital. A paciente, em um segundo momento, foi submetida a anestesia geral, e a cauterização cirúrgica das lesões com laser de CO2 foi realizada. Apresentou boa recuperação e segue em acompanhamento no nosso setor. A vacinação contra o HPV foi indicada.

DISCUSSÃO

Este caso clínico apresenta uma situação comum na prática clínica em que pacientes não recebem orientação de vacinação contra o HPV, pois já teriam sido expostas ou já estariam fora da faixa de vacinação. Porém, apesar de serem causadas por HPV de baixo grau, as lesões condilomatosas atuais estavam causando enorme transtorno e desconforto para a paciente, ainda superior ao desconforto sentido na ocasião do diagnóstico prévio de NIC de alto grau.

CONTEXTO CLÍNICO

A infecção pelo HPV é considerada a infecção sexualmente transmissível de maior incidência no mundo.1 O primeiro pico de incidência ocorre por volta da segunda década de vida e o segundo pico está entre a quinta e a sexta décadas de vida.1,2 Enquanto o primeiro pico está relacionado ao início da atividade sexual, o segundo pode ser explicado por nova exposição ou perda de imunidade.1,3 A imunidade da mulher adulta contra a infecção pelo HPV é muito inferior à da adolescente.1 É importante salientar que, apesar da população jovem ser o grupo com as maiores taxas de contaminação, as mulheres continuam sob risco de contrair o HPV durante toda sua vida e a maioria não foi exposta a mais de um subtipo contido nas vacinas.1-3

Além da proteção para os subtipos de HPV com os quais as pacientes não tiveram contato, muito se discutiu sobre a possibilidade de desenvolver imunidade duradoura nas pacientes previamente infectadas por um subtipo viral após sua eliminação apenas por meio da infecção natural. Em um estudo pioneiro, foi evidenciado que a imunidade humoral após a infecção natural pode não prevenir novas infecções porque os níveis de anticorpos produzidos são geralmente baixos e caem rapidamente. Por esse motivo, mulheres adultas não vacinadas, previamente infectadas nos anos anteriores, não estão protegidas contra novas infecções, inclusive pelo mesmo subtipo viral.1

A discussão sobre os benefícios clínicos da vacinação da mulher adulta contra o HPV torna-se ainda mais relevante diante das baixas taxas de vacinação apresentadas no Brasil nos últimos anos, gerando uma população adulta não imunizada. Por outro lado, os estudos demonstram que a vacina apresenta elevada eficácia na população adulta que já iniciou atividade sexual e que a maioria das mulheres não foi exposta e não apresentou infecção ativa aos subtipos de HPV contidos na vacina após a maturidade.1

A literatura mostra também que, mesmo nas pacientes com lesões prévias desencadeadas pelo HPV, e que já foram tratadas, existem evidências de redução das recidivas com a aplicação das vacinas.1,4,5

No relato de caso apresentado, a paciente já teria indicação de receber a vacina para a prevenção de recorrência da NIC de alto grau tratada, e também para se proteger da exposição pelos outros subtipos virais que ela poderia ter contato. Como a orientação de vacinação não foi feita, provavelmente teve contato com HPV não oncogênico e desenvolveu condilomas vulvares extensos, impactando de forma importante a sua saúde.

Estimular, no mundo todo, a ampla vacinação dos adolescentes contra o HPV é um ponto fundamental na atenção básica de saúde. Porém, especialmente em países com taxas de vacinação abaixo do esperado, não podemos perder a oportunidade de indicar a vacinação para as mulheres adultas com o objetivo de evitar as possíveis complicações causadas pelo HPV.1

    CONCLUSÃO

    Os dados apresentados previamente demonstram os benefícios de avaliar cada paciente atendida e, sempre que possível, recomendar a vacinação contra o HPV nas mulheres e nos homens até os 45 anos de idade.1

    Mais informações sobre a vacinação contra o HPV nas mulheres adultas estão disponíveis no material elaborado pela Comissão Nacional de Vacinas da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).

    Referências:

    1. Roteli-Martins CM, Magno V, Santos ALF, Teixeira JC, Nilma AN, Fialho SCAV. Human papillomavirus vaccination for adult women. Rev Bras Ginecol Obstet. 2022;44(6):631-635.
    2. Muñoz N, Méndez F, Posso H, Molano M, van den Brule AJ, Ronderos M, et al. Incidence, duration, and determinants of cervical human papillomavirus infection in a cohort of Colombian women with normal cytological results. J Infect Dis. 2004;190(12):2077-2087.
    3. Castellsagué X, Muñoz N, Pitisuttithum P, Ferris D, Monsonego J, Ault K, et al. End-of-study safety, immunogenicity, and efficacy of quadrivalent HPV (types 6, 11, 16, 18) recombinant vaccine in adult women 24-45 years of age. Br J Cancer. 2011;105(1):28-37.
    4. Ghelardi A, Parazzini F, Martella F, Pieralli A, Bay P, Tonetti A, et al. SPERANZA project: HPV vaccination after treatment for CIN2. Gynecol Oncol. 2018;151(2):229-234.
    5. Velentzis LS, Brotherton JML, Canfell K. Recurrent disease after treatment for cervical pre-cancer: determining whether prophylactic HPV vaccination could play a role in prevention of secondary lesions. Climacteric. 2019;22(6):596-602.

    Este conteúdo é oferecido pela MSD como um serviço à comunidade médica (aos profissionais de saúde). Os pontos de vista aqui expressos refletem a experiência e as opiniões dos autores. As informações relacionadas a produto(s) podem ser divergentes das existentes na bula. Antes de prescrever qualquer medicamento eventualmente citado, recomendamos a leitura da bula completa emitida pelo fabricante.
    BR-HPV-01384 – PRODUZIDO EM JUNHO/2024 VÁLIDO POR 2 ANOS.

    Material elaborado e produzido pela Europa Press Comunicação Brasil Ltda., para distribuição exclusiva no Brasil.

    Europa Press Comunicação Brasil Ltda