Caso Clínico: Tratamento de paciente com Câncer de Esôfago avançado com PPC>10 em 1L

Dr. Rodrigo Guedes

Dr. Rodrigo Guedes
CRM-BA 17.111

Médico Oncologista; Coordenador Regional da Oncologia D’Or/Bahia

ASSOCIAÇÃO DE PEMBROLIZUMABE AO ESQUEMA QUIMIOTERÁPICO NO TRATAMENTO DE 1.ª LINHA EM PACIENTES COM CARCINOMA ESCAMOCELULAR DE ESÔFAGO AVANÇADO PPC ≥ 10

Introdução

Tradicionalmente, o tratamento do carcinoma escamocelular (CEC) de esôfago avançado era baseado em quimioterapia com platina associada a 5-fluorouracil (5-FU), com ganhos modestos de sobrevida e toxicidade não desprezível.1 Os inibidores de correceptores imunes já vinham se mostrando ativos nesta histologia em outras topografias,2 e mais recentemente em câncer de esôfago em estudos fase II, demonstrando atividade em linhas subsequentes para CEC e adenocarcinoma de esôfago metastático, em especial quando apresentam expressão de PD-L1 por PPC, pontuação positiva combinada (do inglês CPS, combined positive score*)> 10.3,4

Caso clínico

Paciente de 58 anos de idade, sexo masculino, ex-tabagista (20 anos-maço), evoluiu em abril de 2020 com quadro de hemorragia digestiva alta de pequena monta (hematêmese). Nesta ocasião, estava em uso de anticoagulação oral devido a diagnóstico de trombose venosa em perna esquerda no ano anterior. Submetido a endoscopia digestiva alta que mostrou lesão neoplásica em esôfago médio de 5 cm de extensão, vegetante, comprometendo 50% da luz do órgão, friável e infiltrante. A biópsia da lesão confirmou o diagnóstico de CEC pouco diferenciado.

*PPC, pontuação positiva combinada (do inglês CPS, combined positive score).

Realizado estadiamento com tomografias, que demonstravam acentuado espessamento parietal irregular em terço médio esofágico, de limites imprecisos, com redução da luz do órgão nesta região, com extensão de pelo menos cerca de 9,6 cm, associado a linfonodomegalia em região paraesofágica esquerda, medindo 4,1 x 2,2 cm. Complementado o estadiamento com PET/CT scan (tomografia computadorizada por emissão de prótons) que confirmou achados, sem evidência de doença a distância.

Após discussão multidisciplinar, optado por tratamento de radioquimioterapia neoadjuvante (aos moldes do estudo CROSS),5 seguido de tratamento cirúrgico com intenção curativa, realizada em fevereiro de 2021, cujo anatomopatológico revelou resposta patológica quase completa em tumor inicial, porém com 1 linfonodo periesofágico com neoplasia viável – Estádio ypT2ypN1M0. Naquela ocasião, não estava regulamentado pela Anvisa tratamento adjuvante com nivolumabe,6 aprovado em agosto do mesmo ano.7

Após 10 meses do tratamento cirúrgico, o paciente evoluiu com surgimento de nodulação palpável em fossa supraclavicular esquerda logo abaixo da cicatriz cirúrgica (Figura 1). Em 17/12/2021 foi submetido a punção aspirativa por agulha fina da linfonodomegalia supraclavicular suspeita, confirmando recidiva da doença, sugestivo de CEC metastático, com PPC PD-L1 100. Realizado reestadiamento com tomografias e PET/CT scan, confirmado captação em linfonodomegalia hipermetabólica em cadeia supraclavicular esquerda medindo 3,6 x 3,2 cm (SUV, do inglês standardized uptake value = 12,8) e linfonodos proeminentes em cadeia pré-vascular medindo 1,6 x 1,4 cm (SUV = 6,3), compatíveis com acometimento secundário (Figuras 2 e 3).

A - Surgimento de nodulação palpável em região supraclavicular a esquerda, após tratamento cirúrgico com
intenção curativa.
B - Surgimento de nodulação palpável em região supraclavicular a esquerda, após tratamento cirúrgico com
intenção curativa.

Arquivo pessoal do autor.
Figura 1. Surgimento de nodulação palpável em região supraclavicular a esquerda, após tratamento cirúrgico com intenção curativa.

Tomografia de pescoço e tórax
confirmando presença de linfonodomegalia
supraclavicular esquerda e mediastinal.

Arquivo pessoal do autor.
Figura 2. Tomografia de pescoço e tórax
confirmando presença de linfonodomegalia supraclavicular esquerda e mediastinal.

PET/CT compatível com
progressão de doença linfonodal.

Arquivo pessoal do autor.
Figura 3. PET/CT compatível com progressão de doença linfonodal.

Foi iniciado tratamento sistêmico padrão de 1.ª linha com quimioterapia com platina e 5-fluorouracil, associado a pembrolizumabe 200 mg a cada 21 dias, aos moldes do KEYNOTE-590.8,9 Após 4 ciclos evoluiu com resposta parcial maior, nesta fase de indução foi necessária redução de dose da cisplatina (CDDP) no 3.o ciclo devido neutropenia prolongada. A partir do 6.o ciclo seguimos com a fase de manutenção quando excluímos CDDP e mantivemos 5FU e pembrolizumabe nas mesmas doses, a cada 21 dias (realizou 21 ciclos, mantendo resposta quase completa). As tomografias mais recentes de pescoço, tórax e abdome atuais mostram resposta radiológica completa (Figura 4).

Tomografia após tratamento demonstrando resposta radiológica completa.
Tomografia após tratamento demonstrando resposta radiológica completa.

Arquivo pessoal do autor.
Figura 4. Tomografia após tratamento demonstrando resposta radiológica completa.

Discussão

Trata-se de paciente com CEC localmente avançado de esôfago médio, submetido a tratamento multimodal com intenção curativa e que evoluiu com recidiva de doença 10 meses após finalizado tratamento curativo. Nesta ocasião, confirmado que se tratava de um paciente com expressão de PD-L1 por PPC de 100, e optado por iniciar tratamento padrão de 1.ª linha com esquema do KEYNOTE-590, que está aprovado pela Anvisa para tratamento de 1.ª linha de pacientes com tumores de esôfago e da junção gastroesofágica, incluindo tanto CEC quanto adenocarcinoma, desde que apresentem expressão de PD-L1 por PPC ≥ 10 (Figura 5).8

Entre os pacientes com CEC e expressão de PD-L1 por PPC maior ou igual a 10, após seguimento mediano de 22,6 meses, foi demonstrado importante ganho de taxa de resposta (45,0% vs. 29,3%), ganho de sobrevida livre de progressão (HR 0,51) e sobrevida global (HR 0,57) a favor do grupo que utilizou pembrolizumabe em combinação a quimioterapia baseada em platina e fluorouracil (Figura 6).9

Desenho de estudo KEYNOTE-590 (NCT03289719)

Desenho de estudo KEYNOTE-590 (NCT03289719)

*Duração do tratamento com cisplatina por até seis ciclos. Duração de tratamento com 5FU e pembrolizumabe por até 35 ciclos.
5-FU, 5-fluorouracil; EAC, adenocarcinoma esofágico; ECOG, Eastern Cooperative Oncology Group; EGJ, esophagogastric junction; ESCC, carcinoma de células escamosas esofágicas; IV, intravenoso; R, randomization; SCC, squamous cell carcinoma; SLP, sobrevida livre de progressão; SG, sobrevida global.
Adaptada de Shah MA et al., 2024.10
Figura 5. Desenho do estudo KEYNOTE-590 (NCT03189719).

Sobrevida global de CEC de esôfago PPC ≥ 10

Sobrevida global de CEC de esôfago PPC ≥ 10

CEC, carcinoma escamocelular; HR, hazard ratio; PPC, pontuação positiva combinada (do inglês CPS, combined positive score); SG, sobrevida global.
Adaptada de Sun et al., 2021.
Figura 6. Sobrevida global de CEC de esôfago.

Nosso paciente estava contemplado nos dois grupos de maior predição de resposta, CEC com PPC alto (≥ 10). No nosso caso, este PPC era 100. É sabido que os pacientes com CEC possuem maior taxa de resposta ao anti-PD-1, isso é visto em diversos sítios de CEC.8,9 Corroborando com isso, o paciente teve excelente resposta ao tratamento, evoluindo com resposta completa, estando dentre os pacientes que mantém resposta duradoura após 16 meses do início do tratamento. Nunca apresentou toxicidade imunomediada, e desde a suspensão da cisplatina (com a qual evoluiu com neutropenia G3 e náusea G2) não apresentou mais toxicidade ao tratamento. Mostrando não apenas ganho em sobrevida, mas também em qualidade de vida.

Conclusão

O pembrolizumabe associado a quimioterapia baseada em platina e fluorouracil é opção padrão-ouro de tratamento padrão de 1.ª linha de pacientes com CEC ou adenocarcinoma de esôfago e junção gastroesofágica, com expressão de PD-L1 por PPC ≥ 10. É uma opção de tratamento bem tolerado, com ganho estatisticamente significativo de sobrevida global, sobrevida livre de progressão e com baixa toxicidade a médio prazo, com resposta duradoura potencialmente sustentada.8,9

Referências

  1. Kies MS, Rosen ST, Tsang TK, et al. Cisplatin and 5-fluorouracil in the primary management of squamous esophageal cancer. Cancer. 1987;60(9):2156-60.
  2. Harrington KJ, Burtness B, Greil R, et al. Pembrolizumab With or Without Chemotherapy in Recurrent or Metastatic Head and Neck Squamous Cell Carcinoma: Updated Results of the Phase III KEYNOTE-048 Study. J Clin Oncol. 2023;41(4):790-802.
  3. Kojima T, Shah MA, Muro K, et al. Randomized Phase III KEYNOTE-181 Study of Pembrolizumab Versus Chemotherapy in Advanced Esophageal Cancer. J Clin Oncol. 2020;38(35):4138-48.
  4. Reck M, Rodríguez-Abreu D, Robinson AG, et al. Updated Analysis of KEYNOTE-024: Pembrolizumab Versus Platinum-Based Chemotherapy for Advanced Non-Small-Cell Lung Cancer With PD-L1 Tumor Proportion Score of 50% or Greater. J Clin Oncol. 2019;37(7):537-46.
  5. van Heijl M, van Lanschot JJ, Koppert LB, van Berge Henegouwen MI, Muller K, Steyerberg EW, et al. Neoadjuvant chemoradiation followed by surgery versus surgery alone for patients with adenocarcinoma or squamous cell carcinoma of the esophagus (CROSS). BMC Surg. 2008;8:21.
  6. Kelly RJ, Ajani JA, Kuzdzal J, et al. Adjuvant Nivolumab in Resected Esophageal or Gastroesophageal Junction Cancer. N Engl J Med. 2021;384(13):1191-203.
  7. Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Opdivo® (nivolumabe): nova indicação. Disponível em: https://consultas.anvisa.gov.br/#/bulario/q/?nomeProduto=OPDIVO. Acesso: jan. 2024.
  8. Bula vigente de KEYTRUDA®.
  9. Sun JM, Shen L, Shah MA, et al. Pembrolizumab plus chemotherapy versus chemotherapy alone for first-line treatment of advanced oesophageal cancer (KEYNOTE-590): a randomised, placebo-controlled, phase 3 study. Lancet. 2021;398(10302):759-71.
  10. Shah MA, Sun JM, Shen L, et al. First-line pembrolizumab (pembro) plus chemotherapy (chemo) for advanced esophageal cancer: 5-year outcomes from the phase 3 KEYNOTE-590 study. J Clin Oncol 42, 250-250 (2024).
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